A EPBD não pode dificultar o acesso à habitação 54 DIRETIVA EPBD-2024 rio, a sustentabilidade tem requisitos de ambiente, sociedade e economia. Mas o termo sustentabilidade tem-se tornado sinónimo de sustentabilidade ambiental. Para isso tem contribuído a literatura científica, que em uníssono a considera como primeira prioridade. Esta visão contrasta ligeiramente com a percepção social do problema. Porquê? Por um lado, devido à censura interna da Academia relativamente a artigos contrários ao ‘main stream’. Por outro, a sociedade é sensível aos problemas do dia-a-dia, de cada localidade, que são sobretudo sociais e económicos. Em Portugal, e na UE, vive-se hoje uma crise de habitação profunda. O fenómeno tem várias causas que originaram um aumento da procura e falta de oferta nas áreas urbanas. De acordo com o censo de 2021, existem em Portugal cerca de seis milhões de habitações para cerca de quatro milhões de famílias. Seriam suficientes, mas de acordo com o INE faltam colocar no mercado 136 mil casas para responder às necessidades habitacionais da população. Parte desta discrepância corresponde a segundas habitações de nacionais e estrangeiros, entrada de imigrantes sem habitações, e por uma lei das rendas sempre adiada por razões políticas e por interesses financeiros dos bancos. No país há um parque de casas edificadas, vazias ou devolutas de cerca de 723 mil habitações. Em particular em Lisboa existem umas 48 mil casas sem residentes. Destas, a Câmara Municipal tem mais de duas mil casas devolutas e a Misericórdia de Lisboa um número não determinado, provavelmente da mesma ordem. No Porto, cerca de 10% das casas estão devolutas. Mas as existências não se transformam em oferta. Isto criou um aumento do preço das habitações, colocando Lisboa como uma das cidades da Europa do Sul em que a habitação é mais cara – mais que Madrid, Barcelona ou Milão. Em geral, o preço das habitações aumentou muito na Europa, em especial na Hungria, Polónia e Bulgária. Só em Itália o preço estabilizou ou desceu. A falta de casas está a criar um problema social que se pode tornar explosivo, e só se resolve com o aumento da oferta. Esta tem de ser feita com investimento público e/ou privado em novos grandes bairros habitacionais, à semelhança do que foi feito nas décadas de 50, 60 e depois de 80 do século passado; e tem de permitir que as casas devolutas possam ser facilmente colocadas no mercado. Estas habitações devolutas necessitam de renovação e caiem directamente no âmbito da nova EPBD! RENOVAÇÃO DE EDIFÍCIOS Os custos de renovação de um edifício existente são muito variáveis e, em alguns casos, mesmo imprevisíveis. Por isso, a solução de grandes empreiteiros é demolir e construir de novo. No entanto, estima-se que um edifício em razoável estado, com mais de 50 anos, possa ser tornado habitável com um investimento de 150 - 250 €/m2. Mas este investimento coloca-o no quadro de uma grande renovação, ou seja mais de 25% do valor médio de construção definido como 532 € pela Portaria n.º 16/2024. Isso implica ter de cumprir os requisitos de novos edifícios do Sistema de Certificação Energética dos Edifícios (SCE). A manter-se esta imposição, o edifício terá de ser intervencionado ao nível de isolamento, instalações activas e sistemas produtores. O custo da renovação mais que duplicará. Por outro lado, ao contrário de uma reformulação interior que não carece de licença, as alterações a realizar podem obrigar a processos camarários que demoram meses a serem deferidos. Não está em causa a capacidade financeira da aquisição de habitações renovadas. No mercado especulativo em que vivemos, as casas nos centros urbanos são vendidas a 3.000 – 5.000 €/m2. O que está em causa é a possibilidade de colocação de casas no mercado a preços acessíveis e de modo rápido. PROPOSTA E CONCLUSÃO A redução das emissões de GEE é uma necessidade global. Mas a necessidade de habitação é uma necessidade local! Deveremos ter habitações sociais com centrais de aquecimento e de arrefecimento, bem isoladas, enquanto outros não têm acesso à habitação? A grande maioria dos Portugueses sem acesso a habitação são jovens da classe média. Teremos opulência energética nos extremos sociais, os mais ricos e os mais desfavorecidos, mas necessidades de habitação na classe média. A EPBD-2024 não pode dificultar o acesso à habitação. Hoje, na UE e em Portugal, tem de ser resolvido o problema da habitação com o mínimo de conflitos com a EPBD. n
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